Bolsonaro é Chefe de Governo sem legenda partidária. Isso é permitido no regime democrático?

Para entender a questão principal, primeiro devemos ter em mente que a base de todo regime democrático são os seus princípios e valores com influência coercitiva de assegurar os melhores interesses do Estado

Sendo assim, é permitido governar um país democrático - cuja eleição do líder é exclusivamente pelo voto partidário - sem ostentar menção ou injunção política ao interesse do Estado? Em outras palavras

O Chefe de Governo, sendo o líder máximo de uma nação pode ostentar o cargo sem autointitular uma legenda partidária ou a sua legitimidade das politicas públicas? Vamos juntos voltar ao passado e achar respostas

Lembre-se: "Sua casa é aqui"! 

Com isso em mente, questione: - alguém em sã consciência roubaria sua própria casa? Subtraíria seus próprios pertences? Excluiria, dos seus descendentes o que é deles de direito? Todas questões merecem um sonoro NÃO. Sendo assim,

A corrupção e a ganância sempre foram os maiores desafios da Democracia. Para entender esse contexto vamos voltar ao berço dela: a antiga cidade grega Esparta, a mais notável rival de Atenas. 

A poderosa Esparta sucumbiu ao império de Atenas, na Guerra do Peloponeso, ao entrar numa longa, desnecessária e inútil guerra, encorajada por sua aliada Corinto que a acusou de negligência, enquanto alegava que Atenas havia rompido a Paz dos Trinta Anos

Os espartanos tinham um respeitável líder político, o lendário legislador Licurgo 

Para combater a ganância Licurgo ensinou os cidadãos de Esparta a viver uns com os outros na base de uniformidade e igualdade nos meios de subsistência, buscando a preeminência somente da virtude, assegurando não haver outras diferenças ou desigualdade entre os homens. 

Licurgo determinava ao homem culpado por ações vis, atribuír-lhe penas e elogios aos homens por boas ações. Aqui nasceu os princípios da legislação penal

Sabedor das fraquezas humanas frente às injunções políticas momentâneas Licurgo exigiu que as leis só seriam alteradas com o seu aval e quem assim não fizesse seria condenado ao ostracismo, para que assim as leis sobrevivessem aos homens (é o início do atual Poder Legislativo como conhecemos hoje). Representantes que não votam pelos interesses dos seus eleitores, não são reeleitos (ostracismo). Já os princípios constitucionais, que impõem isso, são imutáveis

Licurgo determinava que quando um bom conselho (a boa lei) não era promovido e sim desencorajado, ele admitia que isso acontecia porque a assembléia responsável pela moção (aprovação) substituía seus sérios objetivos por pensamentos tolos, fúteis e vãos. A assembléia se distraia contemplando estátuas, pinturas, enfeites, decoração extravagante de corredores ou dos telhados 

Por isso ele entendia que quando a multidão estava reunida ninguém podia apresentar moção (lei), já os legisladores podiam apresentar suas moções para serem aprovadas ou rejeitadas pelo povo. Assim surgiu o voto e o seu sigilo, para evitar as distrações dos eleitores

Agora quando o povo pervertia ou distorcia o sentido das moções apresentadas, os legisladores tinham o poder de não ratificar a votação e dissolver a assembléia, aqui surgiu o princípio do veto, cujo fundamento de perversão e alteração devem ser barrados quando contrários aos melhores interesses do Estado

Licurgo venceu a ganância e a avareza por meio de artifícios políticos: ele mandou retirar todo metal precioso: ouro ou prata das moedas e ordenou apenas dinheiro de ferro: os chamados penalores

Penalores eram imensas e pesadas moedas de ferro, que pelo seu descomunal peso e massa passaram a ter valor insignificante: para transporta-las eram necessários uma junta de bois e o seu armazenamento exigia uma sala grande da casa

Com a moeda de ferro eliminou a corrupção do governo espartano. 

Afinal quem roubaria, receberia como suborno, ou saquearia aquilo que não podia ser escondido nem transportado sem ser visto? Ou sequer serem cortadas em pedaços com algum lucro? Sabe por que? As gigantes moedas ao serem cunhadas, vinagre era usado para apagar o ferro em brasa, tornando o ferro inútil para qualquer outro propósito, tornando-o quebradiço e difícil de trabalhar 

As donzelas espartanas usavam roupas escassas, e a modéstia as acompanhava o que baniu a devassidão e produziu nos espartanos hábitos de simplicidade e o desejo ardente pela saúde e beleza do corpo. Estimulou o respeito e o culto à beleza étnica do povo. 

As leis de Licurgo deu às mulheres, o gosto do sentimento elevado, pois elas sentiam que também tinham um lugar na arena da bravura e da ambição

Quando uma estrangeira, surpreendida comentava, "vocês, espartanas, são as únicas que governam seus homens", elas orgulhosamente respondiam: "- Sim, nós somos as únicas que damos à luz, homens!" Aqui nasceu o princípio da igualdade entre gêneros

Licurgo era notável por seu discurso curto e sentenciado. Quando algum estrangeiro lhe advertia, ou fazia críticas sobre falta da democracia no seu autogoverno, ele respondia: -"Vá, primeiro estabeleça a democracia em sua casa e volte"! 

Seus cidadãos só participavam de competições olímpicas nos países que não tinham pedintes nem miseráveis em suas ruas

Quando seus cidadãos lhes perguntavam como poderiam impedir uma invasão de inimigos, ele respondia: -"Permanecendo pobre e não desejando ser maior do que o outro"

Quando lhe perguntavam sobre a fortificação da cidade, ele respondia: -"uma cidade será bem fortificada, cercada de homens valentes, não de tijolos" Estimulava a bravura e a coragem do exército espartano 

Perguntas inoportunas e frequentemente repetida, como a famosa:-" quem é o melhor dos espartanos?" Merecia a resposta: "- aquele que é menos como você"! Assim nascia o princípio da equidade

Licurgo fornecia aos concidadãos abundância de lazer já que ele proibia que se engajasse em qualquer arte mecânica para obter dinheiro e com esforços do trabalho acumular riquezas. Sem necessidade disso, a riqueza não trazia honra nem despertava inveja. Aqui nascia as atuais políticas sociais para proteger a subsistência dos mais vulneráveis

Com ausência da riqueza individual e das moedas de ouro e prata, desapareceram  também os processos judiciais, pois os espartanos não conheciam nem a ganância e nem necessidades. A igualdade no bem estar social foi estabelecida e uma vida fácil baseada em necessidades simples. Direito e deveres iguais para todos

E quanto a religião dos espartanos? Licurgo ordenou sacrifícios simples, pequenos e mais baratos, e quando questionado sobre isso, ele respondia: -" Para que nunca possamos omitir de honrar nossos deuses". Fortalecia a fé dos concidadãos, não a ostentação

Confirmar que a democracia é fortalecida com seus princípios, torna inegável respeitar os seus padrões. Não há como fugir disso, sem romper esse vínculo.

A forma de autogoverno exige o estabelecimento da democracia e dos seus princípios, e isso NÃO pode ser suprido ou substituído pelos ideais pessoais ou individuais de um governante

O eleito pela vontade soberana da maioria, é aprovado pelos concidadãos identificados com os principios políticos da sua legenda partidária, e não com os seus objetivos pessoais. Nenhum eleitor seria vulgar e insensato ao ponto de vincular o voto dado só à identidade pessoal do candidato, já que o candidato não existe, sem uma legenda partidária

Os espartanos foram derrotados pela poderosa Atenas, justamente pelo temor da destruição dos valores democráticos. Esse medo fez Esparta mergulhar na ideia pessoal dos coríntios "que juravam de dedos cruzados nas costas" que a paz tinha sido violada pelos poderosos de Atenas

Esparta não sobreviveu, já a democracia reina até os dias atuais 

Um governante democrático pode ser identificado por seus valores pessoais? Nunca. O peso da democracia é levíssimo porque é dividido entre seus cidadãos

Texto de consulta e compilação

https://penelope.uchicago.edu/Thayer/E/Roman/Texts/Plutarch/Lives/Lycurgus*.html